01/05/2011

Ela...Primavera...Ele

Primavera. À poucas horas. O Sol ardia. Brilhava. Despedia-se do Inverno. Ele. A caminho do trabalho. Menos um dia para a reforma. Ensonado. Esconde-se atrás dos óculos. Ouve John Grant. Carrega um livro. Maçudo. Espera a boleia. Só tem uma coisa na mente. Um lugar ao sol. É bem sucedido. Mantém os óculos. Envolve-se nas letras. Ela. Radiante. Jovial. Teve um fim de semana revigorante. É invadida por Adele. Transporta um pequeno livro. Poesia. Sophia de Mello Breyner Andresen. Espera a sua boleia. Só tem uma coisa na mente. Um lugar ao sol. Deseja-o a todo o custo. É a 1ª a entrar. Rápida a percorrer o espaço. Avança. Olhos no sitio perfeito. Sol e...Ele. Estranha-o. De óculos? Fim de semana cansativo, pensa. Senta-se na sua diagonal. Abre o seu livro. Ignora-o. Por momentos. Ele continua afogado em palavras. Não se apercebe da entrada de pessoas. O livro prende-lhe toda a atenção. Ela farta-se do seu. Para ler poesia é preciso um certo estado de espírito. Hoje, Ela, não o tem. Está demasiado alegre. Olha-o. 1 segundo. Sem receios. 2 segundos. Continua fixá-lo. 3 segundos. Tenta ver-lhe os olhos a percorrerem as linhas das páginas. 4 segundos. Um raio de sol incide-lhe nos óculos. Sim, está mesmo a ler. 5 segundos. Continua a desafiá-lo com o olhar. 6 segundos. Tenta chamá-lo apenas com o olhar. 7 segundos. Será que vai conseguir? 8 segundos. Hoje, nem a mudar de página ergue o olhar. 9 segundos. Sente-se traída. Trocada. 10 segundos. Finalmente um movimento diferente. 11 segundos. Fecha os olhos, tira os óculos e coça a vista. 12 segundos. Será agora?, pensa Ela. 13 segundos. Ele abre os olhos. Erguidos. Na direcção dela. 14 segundos. Encaram-se. Sem fugirem. Ele ainda não a tinha visto. Ela chamava por Ele faz tempo. 15 segundos. O contemplar continua. Ele, estupefacto. Apanhou-a a observá-lo. Ela, confiante. Sente que não lhe é indiferente. 16 segundos. Ele é quem foge. Esconde o olhar. Nos óculos. Ambos sorriem. Interiormente. E ambos relembram arte argentina. Ela, uma citação do filme argentino El Secreto DeSus Ojos. "Los ojos hablan". Ele, uma passagem do livro O Viajante do Século do escritor argentino Andrés Neuman. "Sophie olhou Hans. Hans olhou Sophie. Sophie disse-lhe coisas com os olhos. Hans talvez as tenha traduzido".

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